O número de pedidos anuais de cidadania portuguesa feitos por brasileiros aumentou 141% de 2010 a 2020. Passou dos 24 mil para 58 mil, informou o Ministério da Justiça ao Portugal Giro.
Desde 2017, quando a comunidade brasileira em Portugal voltou a crescer, os pedidos aumentaram numa quantidade de três mil a oito mil por ano.
Mas em 2020, ano em que a pandemia de Covid-19 explodiu, o Ministério da Justiça recebeu dos brasileiros 14 mil pedidos a mais que em 2019, como pode ser visto na linha do tempo no final do texto.
Isso aconteceu porque o perfil dos pedidos de cidadania feitos por brasileiros virou alternativa aos tempos de incerteza econômica e política no Brasil, como explicou o arquiteto de sistemas paulista Felipe Freitas, que vive há cinco meses em Lisboa porque conseguiu trabalho.
— As incertezas no Brasil tiveram impacto na decisão de me mudar e de solicitar a cidadania. Consegui vir por conta da demanda crescente de profissionais de tecnologia da informação. Não é difícil encontrar oportunidades de trabalho por aqui — disse Freitas.
O paulista contou que deu entrada no processo quando ainda estava no Brasil com a ajuda do escritório Martins Castro, que conseguiu encontrar registros do bisavô português.
— O meu pai terá a cidadania e, na sequência, sairá a minha e a do meu irmão. Como a cidadania é originária, eu também vou passar para os meus filhos e garantir uma cidadania europeia para as próximas gerações — contou Freitas.
É possível que o aumento de pedidos seja mais significativo. Os dados de 2021 ainda estão em aberto, mas cerca de 56 mil solicitações foram aprovadas até abril: a maior parte feita por brasileiros.
Consecutivas alterações na lei portuguesa que concede o benefício também contribuíram para este aumento. Especialista em direito internacional, o advogado Thiago Huver, da Martins Castro, diz que uma das mudanças relaxou a burocracia ao exigir dos netos apenas o domínio da língua portuguesa.
— É alto o número de brasileiros com direito. Ao longo dos anos, aumentou a divulgação das regras para o acesso. E sempre que existe uma crise financeira e política, a tendência é procurar outros países para residir temporariamente — analisou Huver.
A demanda nos serviços públicos de Portugal tem sido grande e causou um gargalo no trâmite, fazendo com que processos sejam concluídos além do prazo estabelecido por lei.
Um processo de atribuição de cidadania por naturalização, que pode ser solicitado após cinco anos de residência legal em Portugal, leva em média um ano e meio. Mas há queixas de que a espera tem sido maior.
Ao enviar dados ao Parlamento em 2021, o Ministério da Justiça informou que recebeu mais de 11 mil pedidos mensais ano passado. A pasta afirmou que está em andamento a execução de um novo sistema de suporte para reduzir a tramitação.
Atualmente, o andamento dos pedidos pode ser consultado neste site.
O Ministério da Justiça recebe os pedidos e o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) emite o parecer positivo. Em 2020, o SEF recebeu 64,3 mil pedidos de pareceres no geral. Deu positivo a 63,4, sendo 20,8 mil para brasileiros.
Não são apenas os brasileiros que buscam a cidadania portuguesa, que atingiu o recorde de concessões em 2020, com quase 150 mil.
Em abril de 2021, o magnata russo Roman Abramovich obteve a cidadania. Conseguiu os documentos após um processo de reconhecimento que levou seis meses e teria provado a sua descendência dos judeus sefarditas, perseguidos e expulsos da Península Ibérica na Inquisição.
Porém, dois inquéritos investigam a concessão ao dono do Chelsea e fizeram o ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, garantir que a concessão a Abramovich seguiu a lei.
Portugal concede cidadania aos descendentes dos judeus sefarditas desde 2014. Em 2020, a arquiteta e design de interiores paulista Faride Elia deu entrada no processo e aguarda conclusão.
— Consegui pela via sefardita. Mandei os documentos e (o escritório contratado) foi prestativo. Não tive trabalho nenhum — contou Elia, que contratou o Clube do Passaporte.
Ela ressaltou que transmitir a cidadania para os filhos foi a sua maior motivação.
— Tenho gêmeos e me preocupo muito com o futuro deles. Assim que a minha sair, farei a deles. É para o futuro e para a segurança. Caso optem por morar e trabalhar fora, terão esta facilidade — concluiu Elia.
FONTE: Este conteúdo foi originalmente publicado pelo O Globo, um jornal diário de notícias brasileiro, fundado em 29 de julho de 1925 e sediado no Rio de Janeiro.